Grandes mudanças, grandes problemáticas.
É comum em diversas obras de ficção e entretenimento de massa que se acompanhe um dado personagem ao longo de sua vida, seu desenvolvimento, suas angústias, suas alegrias, seu crescimento e amadurecimento, etc. Por isso também é normal vermos em mangás e animes de longa duração (não só na vida real, como também na própria cronologia da série) uma mudança de ritmo, clima ou temática ocasionada pela passagem do tempo ou fatos importantes na vida do protagonista e/ou do universo da série. Tais mudanças, forçadas, necessárias ou coerentes, nem sempre agradam os leitores de uma série, que prefeririam que as coisas continuassem como eram. Aqui irei citar algumas séries B-Shonen de sucesso que passaram por essa transição de fase e, infelizmente, não foram tão bem sucedidos quanto sua primeira fase.
Hokuto no Ken x Hokuto
no Ken 2
Da
dupla Buronson e Tetsuo Hara, Hokuto no Ken estreou em 1983 e rapidamente se
tornou um dos carros-chefes da Shonen Jump. A primeira fase da série é
centralizada no drama dos irmãos Kenshiro, Toki e Raoh, o maior antagonista da
primeira fase (e da série). Durante essa fase que Hokuto no Ken esteve em seu
auge, sendo o mangá mais bem ranqueado da Jump na época. O fim da primeira fase
é marcada pela derrota de Raoh (não acredito que isso seja um spoiler, uma vez
que é natural e clichê o antagonista maior ser derrotado em um B-Shonen). A
segunda fase se passa anos depois disso e vemos uma saturação do roteiro.
Vilões icónicos como Shin, Souther ou Raoh dão lugar a vilões pouco influentes na
série como Kaioh ou Hyoh. As fórmulas da primeira fase são recicladas como
laços entre irmãos, conflitos entre herdeiros de Hokuto e anti-heróis que
surgem para dar uma força à Kenshiro. É inegável que a segunda fase de Hokuto
no Ken se parece mais com um spin-off do que uma parte 2, as origens de
Kenshiro não eram realmente importantes à trama e TODA a segunda fase da série
depende de Raoh em algum momento. Durante essa fase, a popularidade de Hokuto
caiu, de uma série que disputava o primeiro lugar com frequência, passou a ser
uma série de meio de tabela, e nada da segunda fase é realmente lembrada nos
dias de hoje ou tida como “clássica”.
Rurouni Kenshin x Rurouni Kenshi 2
Esse
é mais conhecido pelos leitores mais novos, principalmente pelos filmes
live-action lançados recentemente. De autoria de Nobuhiro Watsuki, Rurouni
Kenshin não tem exatamente o “2”, mas a maioria de quem já viu a série, só
conhece a primeira fase: a “Saga de Shishio”. Em sua primeira fase, Kenshin
possuiu vários arcos não relacionados até iniciar sua saga mais famosa (e que
ajudou a alavancar a série, tirando-o do bottom direto pro top 5). Já sua
segunda fase, a “Saga de Enishi”, considerada por muitos a melhor, nunca foi
adaptada em anime. O fato é que apesar da falta de popularidade, essa fase era
o que o autor tinha planejado desde o início para Rurouni Kenshin, pois
envolvia a busca do protagonista pela expiação de seus crimes como Battousai.
Nas Toc’s, basicamente ambas as fases se equivalem, na chamada “era das trevas”
da Jump, Kenshin era o carro-chefe da revista e só teve uma queda de
popularidade durante seus últimos capítulos, onde foi para o meio da tabela.
Mas no fim, sua segunda fase é desconhecida para quem não leu todo o mangá da
série e é a fase menos popular.
One
Piece x One Piece “New World”
One Piece dispensa uma introdução, em sua viagem
para se tornar o Rei dos Piratas, Luffy deve cruzar a Grand Line, e apesar de
outros eventos marcarem “oficialmente” o fim da primeira fase e o início da
segunda, essa transição também é marcada pela exata metade da travessia rumo ao
One Piece. Assim como qualquer autor de sucesso, Eiichiro Oda segue sua própria
fórmula, que já demonstra cansaço desde a conclusão da saga da CP9 (considerada
a melhor saga até agora). E desde o início de “OP2”, os eventos da série já não
empolgam mais como antes: a tão esperada Ilha dos Tritões foi extremamente
cansativa e desinteressante, Punk Hazard conseguiu a proeza de “superar” o arco
antecessor e Dessrossa, embora empolgante no começo, tornou-se cansativa,
largou vários personagens queridos dos fãs no limbo (Sanji? Chopper?) e até
agora ainda não foi concluída. Com “sorte”, One Piece não é o tipo de série que
sairia do top 5 só por uma má fase (seja por apoio dos fãs, dos editores ou de
ambos). Eu, como fã, ainda espero algo, no mínimo, do mesmo nível de CP9.
Naruto x Naruto
Shippuden
Irei me conter nesse, afinal é o que guardo a
maior quantidade de críticas referente às mudanças de fase, mas serei breve.
Enquanto a primeira fase nos trouxe tudo que amamos da saga do ninja-gari
(personagens, histórias, lutas), a fase Shippuden fez questão de jogar tudo
isso no limbo em favor do “casal” da série. Basta fazer uma lista de tudo que
foi ignorado da primeira fase: 1) Rock Lee (que teve a melhor e mais lembrada
luta de TODA A SÉRIE e não teve nenhuma importância na segunda fase), 2) estratégia
tão importante quanto poder (na primeira fase podíamos ver um personagem como
Shikamaru vencer alguém mais forte que ele apenas com inteligência, tal coisa
se tornou impossível em Shippuden graças ao clima overpower que os personagens
assumiram), 3) vilão de verdade (o clichê reciclável do vilão que tem uma boa
razão para isso e é resgatado pelo protagonista, apesar de passar uma mensagem
até bonita, não só se tornou motivo de piada como também não criou nenhum vilão
melhor que Orochimaru na série), 4) Orochimaru (como citado no item anterior, é
o que melhor assume o papel de vilão da série e foi sumariamente descartado em
favor da Akatsuki), 5) maior importância dos personagens secundários
(convenhamos, nem na saga final esses personagens realmente tiveram um papel
fundamental, a própria morte de Neji perdeu o impacto justamente por ter sido
esquecido desde a luta contra Kidoumaru), entre outros. Nas toc’s, pelo menos
Naruto se manteve sempre como o segundo maior da Jump, independentemente da
fase.
Bleach x Bleach 2
Outro que dispensa apresentações e que serei
breve. A primeira fase, apesar de seus maus momentos (Arco Substituto de
Shinigami), foi responsável pela fama da série em todo o mundo com sua melhor
saga (Soul Society) e sua mais popular saga (Arrancar). Mas já durante a saga
Arrancar, Kubo já dava sinais claros que a fonte estava secando (é só lembrar
do Yammy ou dos fins toscos de Ichimaru e Aizen). Mas a segunda fase começa
numa clara tentativa de imitar a saga de Sensui de Yu Yu Hakusho, apesar do
conceito da saga Fullbring ter sido interessante, ele foi extremamente mal
executado, numa saga que mais parecia um slice of life com elementos
sobrenaturais, no seu clímax, os vilões são derrotados tão facilmente que torna
toda a espera pela conclusão decepcionante. A saga final peca por repetir todos
os clichês que o próprio Kubo criou e culminaram numa saga que se parece em
muito com a saga de Hades de Saint Seiya, ou seja, o autor não sabe como
continuar. Nas toc’s, Bleach saiu da porta do bottom do arco substituto de
Shinigami para virar um dos três pilares durante suas fases seguintes e cair
para o bottom com as sagas Fullbring e Quincy, tornando difícil o investimento
para uma sequência em anime.
Toriko x Toriko “Mundo
Gourmet”
Por fim, Toriko, cuja nova fase começou em
tempos mais recentes comparado aos outros, tem sua nova fase baseada nas
aventuras de Toriko e sua “galera do barulho” agora no mundo Gourmet, ao invés
do mundo humano como na primeira fase. Aqui o autor aparentemente resolveu
abandonar sua fórmula de caçar ingredientes -> enfrentar inimigo humano que
também estava atrás do ingrediente, para se dedicar somente a enfrentar as
criaturas do mundo Gourmet e os Oito Reis. O que é uma grande MÁ IDEIA, uma vez
que agora que existe mais de uma força inimiga (Bishokukai e Neo), e levando em
conta que os ingredientes são justamente os mais importantes do universo de
Toriko (Menu de Acácia), haveria uma razão ainda maior para envolver um
conflito entre esses três grupos a cada continente ao mesmo tempo que se
enfrenta os Oito Reis. Uma grande pisada de bola do autor que poderia fazer
essa fase ser melhor que a primeira. Nas toc’s, Toriko disputava o top 5 desde
sua estréia até assumir a posição de Bleach (por um ano), e ser derrubado rapidamente
pela ascensão sequencial de Assassination Classroom, Shokugeki no Souma,
Haikyuu!! E Boku no Hero Academia.
Considerações finais:
Claro que isso não significa que todas
as segundas fases sejam piores do que a primeira, mas sim que é um grande
desafio para qualquer autor iniciar uma nova fase de sua série e manter sua
popularidade. Também escolhi poucas séries e conhecidas apenas para não tornar
o texto excessivamente longo e mais fácil de ilustrar esse ponto de vista. Tem
mais alguma série cuja segunda fase não seja tão popular quanto a primeira?
Alguma situação inversa? Exemplos que não seja B-Shonens? Ou simplesmente
discordam de tudo que escrevi? Postem nos comentários.
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